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Relato da 1ª visita ao Assentamento Terra Prometida-MST

Relato coletivo da primeira visita ao assentamento Terra Prometida:


Todas as fotos da visita estão disponíveis aqui.

Em 13 de janeiro, um domingo de sol forte, 30 pessoas participaram da visita ao assentamento Terra Prometida, do MST, em Caxias. 11 eram da Rede Ecológica; sendo 7 do núcleo Campo Grande, 1 de Vargem Grande, 1 do Humaitá e 1 da Glória. Os demais eram de diferentes espaços da cidade e movimentos de agroecologia ou parentes de membros da Rede.

No grupo tínhamos cerca de 9 universitários, de Geografia, Oceanografia, Ciências Sociais, Letras, Relações Internacionais e mais dois que tinham interesse em Agroecologia. Tínhamos muitas outras pessoas de diferentes atividades. Havia também um professor doutorando, norte-americano, que trabalha com a questão fundiária.

Havia 21 novas pessoas (77,8% de toda a visita) que estavam conhecendo um assentamento do MST pela 1ª vez. 20 visitantes saíram de Campo Grande em van contratada para esse fim e 10 visitantes saíram de pontos diversos do Rio de Janeiro e se organizaram em dois carros de passeio no molde “carona solidária”.

Fomos acolhidos por lideranças do MST, num total de 8 pessoas (Bianca, Daniel, Juliana, Beatriz, Maurício, Cosme, Luzia e Shirley). Tomamos um café saboroso com café, suco de acerola, raízes, queijo. A água é gostosa e de boa qualidade, comprovada em testes de laboratório. Pode ser bebida diretamente da bica.

Houve uma rodada de apresentação que situava as pessoas, de onde vinham e porquê estavam lá. Da Zona Oeste a Zona Sul, veio gente de todo canto, para conhecer as realidades do movimento… porque não é momento de se separar … pra saber os desafios de um assentamento… porque o momento exige dar visibilidade aos movimentos sociais…” porque vim visitar minha filha q está no MST e é assentada aqui”…

Teve expectativa de todo gosto e a maioria reforçava a urgência do momento político que estamos vivendo e o que iremos enfrentar.

Seguimos para a visita ao lote do Maurício, assentado recente, rodeado de areais, uma realidade de ilegalidade, destruição ambiental, violência e ameaças veladas ou não. Seu sítio é muito bem cuidado.

Aconteceu uma conversa, na verdade uma formação política daquelas, embaixo de uma grande árvore, com bancos improvisados e uma roda de pessoas atentas ao que nos trazia Daniel e Bianca. Como surgiu a ocupação? Por que foram para Santa Cruz? Depois as promessas do Assentamento. E a falta de estrutura para construção das moradias; plantios sem assessoria técnica e direitos sociais que foram acordadas pelo ITERJ – Instituto de Terras e Cartografia do Estado do Rio de Janeiro – e que não vieram até hoje. Muito aprendizado com a luta de famílias que em Santa Cruz em 2000 eram 120. Em 2006, após muitos conflitos, seguem para o assentamento em Caxias e uma parte para Nova Iguaçu. Hoje são 58 famílias. A caminhada no lote do Maurício mostrou a diversidade dos plantios: aipim, quiabo, couve, batata doce, bertalha e outras. Irma ajudou a identificar algumas PANCS – plantas alimentícias não-convencionais.

Aprendendo com a visita ao sítio: seria bom ter um segundo guia além do/a assentado/a do sítio a ser visitado para ficar em outra ponta da visita ao sítio e explicar quais são as plantações e técnicas lá existentes conforme andamos pelo sítio. Na 1ª visita, apenas o assentado Maurício se encarregava de explicar as dinâmicas do sítio e com isso, apenas as pessoas mais próximas a ele na visita (cerca de 10 pessoas) conseguiam escutar e entender sua explicação. Também seria interessante conseguir conhecer 2 sítios próximos, se possível.

Almoço no retorno, muito gostoso, com feijão, arroz, verduras (ora-pro-nóbis e taioba), raízes, ovos cozidos e carré de porco com molho acebolado.

Aprendendo com a comida: no café e no almoço foram valorizados os produtos, modos de preparo e a estética locais. O objetivo foi o fortalecimento da cultura alimentar brasileira e o estímulo a aquisição da produção de pequenos agricultores.

E depois do descanso uma roda, para elencarmos desafios, possibilidades de encaminhamentos, formas de apoio e visibilidade.

Uma parte muito importante foi estimular o debate sobre a importância de comprar de assentamentos e agricultura familiar para a saúde individual, para o meio ambiente e para um sistema menos capitalista. Foram mapeadas algumas oportunidades de fortalecimento através da Rede Ecológica: como a possibilidade de uma vez por mês (no mesmo dia da entrega de secos) ter uma entrega especial de frescos do Assentamento Terra Prometida (principalmente aipim) para os núcleos de Campo Grande e de Vargem Grande. Seriam mais dois mercados para o Assentamento, pelo menos de forma mensal, e uma oportunidade de expandir alimentos da reforma agrária para consumidores da Rede Ecológica (consequentemente, expandindo um certo nível de conscientização também).

Avançou a possibilidade de incluir no sistema da Rede Ecológica os produtos fitoterápicos do Assentamento Terra Prometida, como shampoo, creme de hidratação para cabelo, creme para o rosto, repelente etc. que já estavam pensadas anteriormente. Bianca, recente no Assentamento, está a frente desta produção com um grupo de mulheres e ficou de encaminhar uma lista à Rede.

Pensou-se ainda em Mutirões de manejo/plantios e vivências no Assentamento, que demandariam mais tempo.. Os mutirões teriam pelo menos duração de 48h, as vivências de 3 dias a 1 semana e os estágios de 10 dias a 1 mês/2meses. Alguns assentados receberiam 2 ou 3 pessoas na sua casa e juntos realizariam algum mutirão seja no lote como pro coletivo.

Bia do MST destacou o caráter pedagógico e político que precisa ter qualquer uma dessas propostas. E que para tal precisa ter um planejamento adequado. Que precisa ser melhor discutido no próprio movimento. Foi consenso que precisam partir deles propostas de calendários e que nos comprometeríamos em divulgar para esse cadastro que se formará a partir das visitas. Nosso papel é abrir pontes, criar possibilidades a partir de quem vai e visita.

Foi citado projeto de energia solar sustentável, arquitetura vinculada à organizações que poderiam se interessar. Citamos Litro de Luz, organização que atua na parte da iluminação com projetos sustentáveis para comunidades. Houve problema para estarem este mês na visita, mas estarão em fevereiro.

Observamos a necessidade de aviso a pesquisadores e acadêmicos em geral que qualquer entrevista a ser conduzida no Assentamento ou produção de vídeos para fins de pesquisa precisam ser avisados antes. Neste dia estava um pesquisador norte-americano que conduziu entrevistas para fins acadêmicos sem avisar antecipadamente, assim como acadêmicos da UERJ quase conduziram um vídeo com câmeras profissionais sem também avisar previamente.

Mais ao final, fizemos a feirinha com produtos dos assentados. Ficou claro que os assentados não se organizaram para tal e que deverão fazer isto numa próxima visita. Sugerimos que seja encaminhada uma lista aos participantes da visita, com os produtos disponíveis e preços para listar o que queriam comprar e informar quantidades totais para que levassem para a sede da cooperativa e ser distribuído.

Para dar uma ideia: foram vendidos 10 dúzias de limão, 29kg de aipim, 7kg de batata doce, 2 molhos de chaya, 2kg de pimenta, 16 molhos de couve, totalizando R$266,00. Mais os produtos fitoterápicos que não temos o valor total. Retorno de R$900,00 do valor cobrado pelo café da roça e almoço da reforma agrária.

Destaques para a próxima visita: – Realizar a caminhada logo na chegada, sem a roda de conversa. Deixar a conversa mais ampla, de caráter mais político para depois da caminhada no lote, depois do almoço. Nela super importante contar a história de luta do assentamento.

Fundamental na roda pensar estratégias e possibilidades, considerando que é um processo inicial que demanda estudo de viabilidade em tudo que for pensado e que a continuidade ou complementação pode se dar nas visitas futuras.

Do ponto de vista da Rede Ecológica seria muito importante transmitir informações sobre o MST em vários cantos, inclusive levando estas informações ao exterior. A carta semanal com estas informações deveriam ser lidas anteriormente e compartilhada na roda de conversa.

Uma das funções principais foi plenamente atingida: repercutir a história do assentamento, conhecer as realidades e desafios.

Foram realizados 2 mini vídeo-documentários com entrevistas com assentados a serem divulgados em breve. Ana Galizia da Rede Ecológica fez um vídeo curto com tomadas do assentamento e visita em geral com um depoimento que foi um dos momentos mais marcantes da visita: a família da Juliana, que mora no assentamento, foi visita-lá, não conhecia a fundo a realidade que ela vivia. A mãe, D. Romilda falou na roda de abertura: “Assim que minha filha Juliana entrou para esse treco de MST, eu não entendia nada, hoje defendo e explico sobre o movimento para todos”. Foi lindo ver D. Romilda, Renata, irmã de Juliana e seu cunhado Marcelo neste reencontro.

Foi abordada a oportunidade de parceria com organização internacional Litro de Luz, responsável por levar luz até moradores de comunidades locais que não possuem acesso à energia elétrica utilizando uma tecnologia simples, econômica e ecologicamente sustentável, composta por garrafas plásticas, painéis solares e lâmpadas LED.

Neste mesmo sentido, houve a oportunidade de participação na pesquisa promovida pelo grupo de pesquisa da UNIRIO em “Apoio Técnico-científico para fortalecimento, consolidação das Políticas Públicas voltadas para a Agricultura Familiar do Brasil ” em parceria com a Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário (Sead).

Uma sugestão para visitas futuras é o estímulo a mais debate sobre a importância de uma diversificação de plantio de culturas para o solo, para o meio ambiente e para as conjunturas políticas e sociais. E igualmente que se entenda melhor a diferença entre produtos orgânicos e agroecológicos, a importância de não usar agrotóxicos, o papel das sementes e de como diversificar a alimentação (incluindo PANCS e menor consumo animal). Neste sentido fica para vários a sugestão que a alimentação seja vegetariana neste encontro, tornando a proposta mais de acordo com as propostas da Rede Ecológica.

Foi um momento maravilhoso e inspirador!