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Audiência Pública examina Crimes Ambientais no Assentamento Terra Prometida e no Rio Iguaçu


Assista ao vídeo da Audiência.

Mayella nos encaminhou o relato da audiência ocorrida no último dia 10/05 na ALERJ, onde Miriam Langenbach representou a Rede Ecológica e cuja fala constou da carta 13/2019. Vamos ao texto do relato:

A audiência foi construída em articulação com o assentamento Terra Prometida, tendo em vista a questão da segurança alimentar e da preservação da vida e manutenção de áreas de preservação ambiental na baixada fluminense.

São interlocutores os mandatos das deputadas Dani Monteiro (PSOL), Renata Souza (PSOL), deputados Waldeck Carneiro (PT) e Flávio Serafini (PSOL). A audiência foi presidida pela deputada Mônica Francisco (PSOL).

A deputada Mônica iniciou a audiência falando sobre a APA do alto Iguaçu, instituída pelo decreto 44.032/13, abrangendo os municípios de Duque de Caxias, Nova Iguaçu e Belford Roxo. É uma unidade de conservação de uso sustentável, com grande sociodiversidade. As mulheres são maioria populacional nesses municípios, e trata-se de uma região forte na produção agrícola.

São aspectos sensíveis a efetivação do PAA (Plano de Aquisição de Alimentos) e o PNAE Plano Nacional de Alimentação Escolar nas redes municipais e estaduais, sobretudo no aspecto dos preços, atualmente definidos pela tabela de preços da FGV (e não pelos agricultores), bem como a questão dos 30% para os alimentos produzidos pela agricultura familiar.

A precariedade da infraestrutura de arruamento, energia elétrica, saneamento básico, equipamentos públicos de saúde também foram colocadas como problemas na região para os assentados.

O promotor Júlio Araújo, que é procurador em São João de Meriti, e que atua na região da APA, apresentou as duas frentes de trabalho, na perspectiva da visão do meio ambiente pela sua preservação, em conciliação com os direitos sociais. São elas a promoção e conjugação dos direitos sociais na área e a cobrança do papel de fiscalização dos órgãos competentes para barrar violações.

Foi realizada uma reunião conjunta no dia 13/05 entre o Ministério Público, INEA e Polícia Federal para discutir estratégias de enfrentamento à extração ilegal de areia na região da APA do alto iguaçu. Hoje, 16/05, também acontece uma reunião mais ampla, com ITERJ e INCRA, para acompanhar avanços e demandas com relação à questão do assentamento e areais.

O representante do INCRA, Roberto Máximo, pontuou que a atuação do órgão é feita em conjunto com o ITERJ, com a aplicação de créditos. Tiago Rangel, representante do INEA, apontou que a região é um importante remanescente de Mata Atlântica, sendo também uma zona de contenção de cheias. Daí o empenho do órgão em combater o crime federal de extração ilegal de areia, que compromete o regime hidrológico da região. Ele pontuou que no dia 17/04 foi feita uma megaoperação, com 16 pessoas presas, e 6 equipamentos apreendidos. Nesse contexto foi constituída uma força-tarefa dentro do INEA para atuar no combate a areais clandestinos, e que há uma agenda de fiscalização para toda a região. No dia 07/05, foi feita uma operação na Estrada das Escravas, no Amapá (Duque de Caxias), na qual foram presas 6 pessoas.

Apesar dessas operações, Tiago colocou que o INEA está com dificuldades logísticas, pois não tem condições de retirar alguns equipamentos, que demandam o desmonte de estruturas. Para tanto, é necessária a realização de licitação para contratar o serviço de desmonte. Além disso, grande parte dos equipamentos dos areais clandestinos são alugados. Portanto, mesmo sendo apreendidos pelo órgão, são facilmente substituídos.

O representante do ITERJ, Antônio Renato Cunha, foi questionado sobre a existência de um prazo do órgão para o atendimento dos compromissos firmados quanto à regularização fundiária. Ele colocou que até agora foram realizadas 4 reuniões, no âmbito da nova gestão do órgão. Na semana da audiência, foram entregues 9 titulações no assentamento Terra Prometida. Estão em andamento mais de mil processos de titulação. Com relação à infraestrutura, enviaram um ofício para Caxias a respeito da pavimentação da avenida 28 de novembro. Também seria enviado um ofício para a prefeitura de Nova Iguaçu. Foi distribuído um novo processo à Light, para a instalação da rede de energia elétrica.

Ivanete Silva, representante do Fundo Municipal de Direitos das Mulheres de Duque de Caxias, ressaltou a importância da APA como zona de contenção natural e como espaço produtor de alimentos da agricultura familiar. Apesar dessa importância, os agricultores assentados estão reclusos, ameaçados pela extração ilegal de areia (inclusive o prédio da escola Sargento João Délio, que fica ao lado de um dos areais). Encontram-se, em suma, numa condição social vulnerável, privados de assistência em saúde, rede de energia elétrica, tendo que driblar uma infraestrutura precária (sem arruamento e transporte público) para escoar sua produção.

Além disso, Ivanete Silva ressaltou a burocracia enfrentada para participar das licitações do PNAE, bem como o calote dado pela prefeitura de Duque de Caxias, que não pagou os alimentos entregues pelos agricultores. A falta de arruamento também é uma questão. A prefeitura recebeu o maquinário para fazê-lo, mas ainda não executou a obra. Não havia representantes municipais na audiência, e essa ausência foi apontada.

Miriam fez uma fala apresentando a Rede Ecológica como uma alternativa sustentável, solidária e colaborativa para acessar alimentos saudáveis, da agricultura familiar e reforma agrária. Contou um pouco da trajetória e da organização da Rede Ecológica ao longo desses 18 anos de existência. Foi uma fala fundamental, pois evidenciou a importância dessa parceria campo-cidade, e sensibilizou a audiência para a necessidade de revisão das formas tradicionais de acessar os alimentos, destacando com muita propriedade o bom trabalho que os assentados do Terra Prometida vem desenvolvendo junto à rede, oferecendo sempre alimentos de excelente qualidade, e bastante diversificados.

Ramon Neves, subsecretário de desenvolvimento rural, falou sobre as reais condições para a construção da estrada. Segundo ele, há um acordo de 90 dias com a prefeitura de Duque de Caxias para a construção de uma parte da estrada, inclusive com maquinário disponível. O subsecretário ressaltou a importância que a agricultura tem como uma alternativa econômica para geração de emprego e renda na região, bem como para garantir a permanência dos agricultores assentados. Ele também pontuou o peso das limitações orçamentárias na atuação, por exemplo, do trabalho da EMATER na assistência técnica rural, bem como a destinação da maior parte do orçamento para o agronegócio, em detrimento da agricultura familiar.

A respeito da EMATER, um representante da associação dos funcionários da empresa fez uma fala apontando o desmonte interno que esta vem sofrendo. Perseguições a diretores técnicos, precarização dos trabalhadores (o escritório de Sumidouro está sem luz há dois meses). O trabalho de assistência técnica e extensão rural vem sofrendo prejuízos, prejudicando o trabalho na ponta com os agricultores. Na atual gestão foi feito um contigenciamento de 15 milhões do seu orçamento.

Ramon Neves destacou que a EMATER conta com apenas 0,5% do orçamento total do estado. Por isso, tem sido feito um trabalho pedagógico no âmbito da secretaria para evidenciar a importância da assistência técnica rural para a manutenção da política agrícola. Bem como a sensibilização de outros órgãos, para a diminuição de influência política na pasta, e o fortalecimento de discussões sobre a recomposição orçamentária e do quadro técnico na EMATER, com a valorização salarial dos trabalhadores. Ademais, tem sido conduzida uma abertura e procura de investimentos no exterior, além de uma tentativa de retomada do Rio Rural, e a busca de emendas parlamentares.

A representante do gabinete do deputado Flávio Serafini convidou todas e todos a participar de uma Audiência Pública a ser realizada no dia 12/06 sobre o PNAE estadual. Segundo ela, essa questão do Rio-Rural e do financiamento vem sendo prolongada de gestões anteriores. O crédito rural do PRONAF foi praticamente zerado, e hoje a comissão de agricultura da ALERJ só trabalha para o agronegócio.

Cláudio Amaro, do Terra Prometida, falou sobre como a agricultura em APAs é uma realidade na baixada fluminense. Apesar disso, a infraestrutura é precária, e os agricultores têm que conviver com uma realidade de violência, tráfico de drogas e milícias. Há uma preocupação sensível com a juventude e com os idosos. Para a juventude não há investimentos, e tampouco incentivos para permanecer no campo, dedicando-se à agricultura. No caso dos idosos, preocupa a questão da aposentadoria (a maioria recebe BPC, pois a burocracia do INSS é tamanha que inviabiliza o acesso ao benefício integral). Além disso, as doenças são tambeḿ uma realidade para os produtores rurais.

O principal encaminhamento da Audiência Pública foi a formação de um grupo de trabalho para acompanhar de forma mais detida os compromissos firmados e a atuação dos órgãos públicos com a garantia da infraestrutura para a atividade de agricultura na região. A primeira tarefa colocada foi a garantia do pagamento dos agricultores pela prefeitura de Caxias no âmbito do PNAE.