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As trincheiras de luta a partir da cozinha do CEM

Texto de Ana Santos

A construção de uma cozinha coletiva nasce – renasce, a partir do quintal da Sandrinha. Quando fizemos a reforma da rua e da escada, para  receber as cestas, incluímos um canteiro no caminho da escada – e a gente fica brincando dizendo: “tinha uma horta no meio do caminho”…  porque a escada é muito simbólica, pois é por onde todos os moradores passam. Nessa escada, está a casa da Sandrinha, que tem um quintal, o que é coisa muito rara dentro de uma favela, porque os quintais vão sendo ocupados por quitinetes, seja para abrigar pessoas da família que cresce, seja para gerar renda a partir do aluguel. Esse quintal  remanescente na favela, onde já de entrada tem um cajueiro, um pé de jamelão, de goiaba baleeira, começa a ser cultivado e cuidado pelas mulheres.

E o que é possível? A cozinha. Ela tem dentro deste quitinete uma cozinha, que a gente transformou num espaço coletivo, que foi inaugurado com o cozido agroecológico. La foi onde teve a produção do bolo e onde está tendo a produção da jaca. A jaca, antes de a gente fazer ela cozida para fornecer para a Rede Ecológica, nós fizemos um teste. Eu quis trabalhar com elas a criatividade e o pensar esta jaca para que quando elas pudessem manusear, transformando em sacos de meio quilo congelado, elas pudessem refletir sobre aquele alimento e pensar que ali estavam empacotando como se fosse carne. Da jaca foi feito nuggets, hambúrguer e nós fizemos um bate papo ali, comendo, apreciando, acompanhado de uma maionese de inhame.

Essa produção gerou em seguida – nós fomos a Vargem Grande  de carro com motorista local, trouxemos as jacas e no lugar de produzir no Francisco (produtor de bananas), a gente produziu nesta cozinha. A gente achava que o custo com gás ia ser muito alto, mas acabou sendo mais viável para nós, porque carregamos menos peso e teve um lugar mais acolhedor. Agora a gente está com um projeto junto a Soltec, com a engenheira civil Amanda Azevedo que está fazendo o redesenho do quintal da Sandrinha. Com um viveiro de mudas, com um forno de barro (um projeto que vai ser apoiado pelo Canadá), com um espaço de convivência e com essa cozinha dialogando entre esta área externa verde, com a escada e este canteiro que está de frente a casa dela. Então a gente entende a casa da Sandrinha como um ponto central, assim como o CEM, que está numa outra ponta, já mais perto da área da roça. Foi a maneira de a gente fortalecer os espaços e ao mesmo tempo houve o amadurecimento de que se a gente perde alguma coisa, a gente não perde tudo, porque o trabalho está pulverizado em diversos espaços dentro da comunidade.

Então essa cozinha se torna um trabalho potente da agricultura urbana, onde a gente consegue plantar também, um local que é gerador de energia, geração de renda, geração de novas propostas de alimento, onde a gente trabalha a educação alimentar. É um local de  geração de encontros, geração de fortalecimento de uma mulher, de várias mulheres, mas de uma mulher em especial, que é a Sandrinha: uma mineira que tem uma história muito sofrida de vida e é mãe da Gabriela que é uma jovem surda que participa do projeto de comunicação.”