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Iniciamos o balanço 2020 e o planejamento 2021 do CAC

Abaixo o texto que situa o balanço e planejamento do primeiro território abordado – o Centro de Atividades Comunitárias em São João de Meriti – o CAC, em reunião da Coordenação da Campanha.

Considerações feitas sobre o CAC a partir da reunião de 15.1.21 com a presença de Adriana Camargo (São João), Beth Bessa (Grajaú), Miriam Langenbach (Urca) e Rafael Moura (São João).

 

  1. O CAC é uma iniciativa atípica dentro da campanhaA iniciativa não surgiu do próprio CAC e sim da Rede, que via neste espaço uma oportunidade importante de desenvolver um trabalho de educação ambiental, com fortalecendo do plantio em seu quintal. O que o CAC fez, por sua própria conta, neste primeiro momento de impacto da pandemia, foi organizar uma doação de cestas básicas tradicionais para as famílias.
  2. Foi o último território a entrar na campanha, elaborando coletivamente uma proposta, integrada por membros do núcleo, mais especificamente Adriana e Rafael. O CAC também contou inicialmente com a participação de Jussara, com Beth e Miriam, gestoras de outros núcleos, acompanhando no coletivo do núcleo. A proposta era de que a distribuição de cestas fosse um estímulo à participação das famílias no trabalho da horta comunitária. Tanto que, só depois que aceitaram participar da horta comunitária, ficaram sabendo de que tínhamos conseguido as doações das cestas para ajudar as famílias que participassem da horta. Mesmo assim, das 10 pessoas que se inscreveram no projeto apenas 4 ficaram…
  3. Este foi o único território com este tipo de proposta que colocou uma dinâmica diferente: uma expectativa – quase exigência – de retorno em termos de presença no horário combinado de trabalho (4 horas semanais). Na verdade, é um combinado: temos uma doação de cestas para nos ajudar enquanto não começamos a produzir, mas se não plantarmos, uma hora as cestas acabam e tudo volta a ficar como antes.
  4. O caminho proposto pelo CAC e aprovado pelo grupo foi começar com uma doação de cesta agroecológica para as 60 famílias da escola, onde se falava do CAC e da horta, mas sem que nenhuma proposta em si tivesse sido detalhada. Foi muito trabalho de preparação – contato com o grupo por zap, já que a escola não estava em funcionamento, preparo de material escrito contendo uma receita. Tudo exigiu esforço para uma escola que funciona com muita dificuldade em cima de um voluntariado forte de sua equipe.
  5. Mas o resultado foi que poucas famílias toparam, o que, de certo modo, já prevíamos. Eram inicialmente 10 famílias interessadas que se reduziram para 4 mulheres. Essa configuração trouxe visibilidade às vivências e trocas, que não temos nas outras experiências, das pessoas dos demais territórios. Uma questão observada foi a importância do trabalho na horta para as mulheres, como um espaço de compartilhamento dos sofrimentos, um espaço de fala, às vezes mais especificamente trazidas para o coordenador, Rafael. Foram ativas no enfrentamento dos problemas, como o dos carrapatos. Tiveram iniciativas como de trazer bolo para o dia da horta. É um espaço de contato com outros tipos de alimentos, troca de informação e de conhecimentos sobre modos de plantação, ervas medicinais e espécies de plantas e alimentos, entre outros.
  6. Ninguém tinha experiência com agricultura urbana. Rafael, engenheiro, muito dedicado à Rede, interessado na proposta e já realizando há anos uma ação de educação ambiental no quintal do CAC, se propôs a assumir a direção dos trabalhos, mas sem experiência. Daí também o esforço de criar um GT de agricultura urbana por parte da Rede para ser um espaço de trocas sobre dúvidas e questões. Com esse mesmo intento foi feito o I Seminário sobre agricultura urbana como parte da campanha.  Entraram como apoio Sérgio e Ítalo, sendo Ítalo do Núcleo e Sérgio, um amigo da Rede. Com sua presença na horta, eles foram muito importantes para o fortalecimento do trabalho. Nos últimos meses, por várias questões, também não puderam mais estar lá, não deixando dúvida de que, num grupo pequeno, cada pessoa ganha uma importância especial.
  7. Muitos obstáculos: o CAC estava sem ninguém morando no espaço o ano todo, e a escola, não sendo frequentada, deu ensejo para que houvesse invasões, como a de uma pessoa que arrombou o cadeado e colocou seu cavalo dentro do quintal, comendo tudo o que tinha sido plantado anteriormente. Além disso, trouxe um surto de carrapatos.  Esses transtornos foram sendo enfrentados coletivamente e com a ação paciente de Rafael. O CAC passou também por momentos de precariedade por inundação de suas instalações, momento em que entrou outra pessoa do núcleo, Erika, para conseguir apoio para consertos junto à prefeitura e contou com Ítalo e Sergio para pensar o reparo da parte elétrica e hidráulica do prédio  afetado. Finalmente,  teve-se de lidar com a invasão de formigas, que comeram boa parte das mudas.
  8. Tudo isso levou a que  por longo tempo não houvesse plantio e consequentemente, em meses de trabalho, não houvesse nenhuma colheita de produto. Algo desestimulante para as mulheres, levando a que muitas não comparecessem no final do ano. Será importante se pensar em plantar imediatamente 
  9. plantas que brotem e cresçam rapidamente, como cebolinha, manjericão e ervas.
  10. As entregas feitas por parte das produtoras do Coletivo Hydras foram por várias vezes tumultuadas. O exemplo mais extremo aconteceu na primeira entrega, momento de muita expectativa por parte das famílias e equipe do CAC, em que as cestas chegaram horas depois. Todas as famílias já tinham ido embora – dando trabalho extra para a equipe da escola e Rafael. Acabou ocorrendo descontinuidade das entregas, em função da doença dos pais da produtora que levava os produtos..

O fato de ser um grupo tão pequeno era desfavorável às produtoras que traziam as cestas, porque não compensava levar os produtos até lá. Isto fez com que se repensasse a frequência das cestas, que deixaram de ser quinzenais, e passaram a ser mensais. Isso não com os produtos do coletivo e, sim da Rede, dando-lhes direito a pedir frescos e alguns produtos secos, no valor das 2 cestas iniciais, que eram inseridas nos pedidos do núcleo, no dia da entrega dos secos. Outra coisa mais que aconteceu no CAC diferente dos demais territórios: as 4 mulheres, de certo modo, passaram a fazer parte do núcleo, mas isto lhe colocou um desafio: como integrar essas mulheres com uma realidade tão diferente dos demais integrantes? Uma primeira impressão é que acabou sendo criada uma divisão dentro do Núcleo: Mulheres da horta e cestantes. Mas o fato é que a participação das mulheres no Mutirinho faz com que elas sejam apresentadas a alimentos que outros cestantes pedem, propiciando que elas conheçam e experimentem diferentes alimentos que são entregues aos cestantes e que, muitas vezes, até quem comprou desconhece. Duas questões se colocam aqui:

  • Como agir para que estas diferenças sejam menos problemáticas?
  • É possível?

Novamente surgiu uma característica diferente e inovadora: O CAC é o único território que se integra a um núcleo da Rede, algo que, se der certo, será muito significativo.

  1. Pensando em 2021, partimos de várias hipóteses que certamente passarão pelo que as mulheres expressarem como desejo, a partir de um balanço que será feito:
  • encerrar o trabalho da horta; encerrar a troca, e deixar aberto para as mulheres receberem a doação de cestas, sem necessariamente terem de fazer a horta.
  • caso a opção de participação na horta permaneça, será possível reconhecer que essa proposta será tomada a sério, especialmente na questão da frequência e na manutenção do horário. Desse modo, não se marcará outras atividades concomitantes.
  • No cenário acima, dar continuidade à horta, aumentando o número de famílias, tanto fazendo nova chamada na escola, quanto nos arredores, para tentar dobrar o número de pessoas no projeto;
  • pedir para cada mulher trazer uma pessoa conhecida sua;

 

  1. Viu-se que as iniciativas da FAG e do CEM  podem ser muito especiais para o CAC com possibilidade de compartilhamento e apoio. A FAG, inclusive, a partir de seus acompanhantes e do núcleo Campo Grande, já colocou o desejo de apoiar a horta do CAC, fazendo mutirões. O CEM com seu encontro de quintais se coloca como uma possibilidade muito interessante de aprendizado, que as mulheres poderiam ser estimuladas a frequentar. E finalmente o Hydras da Terra poderia fazer um trabalho formativo, a partir de sua experiência com plantio. Estas iniciativas, além de serem subsidiadas, precisam ser sistematizadas de forma a se criar vínculos.
  2. O CAC, com o espaço que possui, pode conseguir um formato de funcionamento comunitário que dê muito certo, que contribua para a formação oferecida na escola, podendo desenvolver um trabalho que será fonte de inspiração para outras iniciativas do gênero.
  3. Uma mudança muito positiva está para acontecer: uma família, integrada por um casal, dois filhos adultos e 4 cachorros, vai morar lá (a presença dos últimos configurou certo problema). Um contrato de 2 anos muito interessante foi feito, no valor de referência de R$ 900,00. A família não pagaria em dinheiro pela moradia, mas sob a forma de melhorias que seriam feitas no CAC, o que incluiria estabelecer relação com a comunidade, visando evitar depredações da instituição. A participação na horta também está entre as atribuições da família que, ao se estabelecer, deverá junto ao grupo da horta definir qual a melhor forma de participação e passará a receber também uma cesta da campanha.
  4. Viu-se a importância dos cestantes do núcleo São João terem uma maior participação no processo, tanto em termos de discussão, quanto de ação. Apoiar a horta de diferentes formas poderia ser a principal ação, além de cuidar do núcleo. De fato, o núcleo passou a crescer em relação aos anos anteriores, tendo atualmente 7 integrantes. Foi destacada uma questão importante de ser tematizada na comissão gestora da Rede: tem que ficar claro que, em relação aos demais, os núcleos mensais têm um envolvimento menor com a Rede, ocorrendo poucas trocas entre os membros, já que a frequência de consumo de alimentos acontece uma vez por mês. A grande exceção acontece em Campo Grande, onde o grupo além do contato mensal com a Rede, desenvolve uma participação sistemática, semanal, na feira. Um diferencial  muito importante são as lideranças locais, integrantes da Rede Carioca de Agricultura Urbana, que conseguiram, ao longo de 10 anos, fazer com o que o grupo seja talvez o mais atuante da Rede Ecológica.

Clarear esta questão é importante, para que as expectativas quanto à participação das pessoas fiquem mais bem dimensionadas. No caso do CAC, é fundamental dar um apoio maior à Campanha através da horta, caso ela continue. Entendendo-se que, neste momento, este apoio não seria presencial.

  1. Para finalizar, voltemos aos três objetivos que a campanha tem, no sentido de maior autonomia e empoderamento: criação e desenvolvimento da agricultura urbana, geração de renda através do preparo de alimentos e organização de uma feirinha com produtos agroecológicos. Em certo momento, foi cogitada a possibilidade do CAC sediar a entrega dos produtos da reforma agrária, com a participação de pessoas de fora. A ideia acabou não avançando, mas é algo a ser pensando com cuidado entre a equipe e o Hydras da Terra. Quanto ao potencial de geração de renda através do preparo de alimentos, não há dúvida que o CAC tem instalações que possibilitariam isto. Ficamos de compartilhar estas reflexões com o núcleo para irmos avançando na análise e nas propostas.