Blog

Fazendo algumas considerações sobre a Rede Ecológica

Num período em que proliferam produtores agroecológicos se unindo para oferecer seus produtos, entre eles os próprios movimentos sociais como MST e MPA, além de outros formatos de compras coletivas, a Rede talvez precise se preocupar com sua sobrevivência, a exemplo do que aconteceu com a Coonatura, sua antecessora. Há 40 anos, a Coonatura era hegemônica na cidade; mas ao longo dos anos, foi aos poucos perdendo seus associadas, que encontravam novos formatos mais adaptáveis à sua realidade, levando- a ao fechamento de suas portas, aos 20 anos de existência.
Será que esta é uma questão a ser avaliada pela Rede Ecológica, que acaba de completar 20 anos?

A Rede Ecológica atualmente concentra sua compra de frescos em dois assentamentos grandes, e alguns poucos outros produtores. Mas, nossa organização joga o foco para esta compra nos núcleos situados na zona sul da cidade, mais antigos, região em que há valorização da proposta agroecológica. São estes os núcleos que buscam uma compra semanal, historicamente. Já os núcleos Grajaú (zona norte) e Niterói compram frescos quinzenalmente, não havendo um número suficiente de associados motivados por uma compra semanal.

Nos núcleos mensais, 6 dos onze existentes, por iniciativa da própria Rede, a compra de frescos é feita localmente com produtores buscados pelos seus integrantes.
Isto traz uma pulverização da Rede Ecológica e, no final da contas, um número de compradores relativamente reduzido para estes assentamentos maiores.

Será que esta situação pode representar uma ameaça? Acreditamos que não, por alguns aspectos que nos diferenciam:
Primeiramente existe a compra mensal de alimentos chamados secos, que unifica a Rede Ecológica, viabilizando o acesso a produtos de excelência, vários não encontráveis no mercado, vindos de muitos cantos do país. Pela completude desta compra, não há mais necessidade de irmos ao supermercado, a não ser para poucos itens. Esta saída é algo muito significativo. Se mais grupos deste tipo surgissem, poderia se tornar uma ameaça ao agronegócio urbano, que são os supermercados.
A compra de secos certamente é o chamariz mais importante para os que buscam nossas compras.

Porém entra nesta procura, alguns outros aspectos que acabam definindo a Rede Ecológica como uma iniciativa engajada: uma característica, que torna a Rede Ecológica algo diferente e emblemático é o protagonismo dos consumidores, que participam de toda a construção da proposta, alguns mais, outros menos. Fica claro que a adesão à Rede não é para tantos, já que as pessoas muitas vezes não se interessam, preferindo esquemas mais simples e práticos, especialmente os ligados a delivery, preocupados que estão com sua solução individual de acesso a alimentos orgânicos.
Quem fica na Rede, não está apenas para resolver suas situações individuais de abastecimento alimentar, cuidando da própria saúde. Boa parte dos nossos associados tem uma preocupação ampla, social e ambiental, que levou a Rede a se organizar em múltiplas comissões que trabalham nesta direção. Esta militância micropolítica empolga a vários, que se mantém fiéis, apesar das tentações. Por isto acreditamos que a Rede será capaz de enfrentar os vários formatos de compras que vão se apresentando em disputa.
Vejamos alguns exemplos do tipo de ênfase social e ambiental, baseados na nossa parceria com o campo, dentro do lema Campo e Cidade dando as mãos:
– a existência de um fundo rotativo para empréstimo para nossos motoristas e produtores, vindo das economias de nossos associados, possibilitando o acesso a consertos de carros, compra de equipamentos, etc., em condições que não existem no mercado, já que a devolução do dinheiro se adapta às condições das pessoas: é suave, com o menor juro possível;
– a compra de um caminhão através de empréstimos e doações é outro exemplo de viabilização de necessidades do campo com o apoio da cidade.
– a partir da pandemia, o comprometimento da Rede Ecológica com a tragédia social enfrentada pela população, a levou a desencadear a Campanha Campo e Favela de Mãos dadas contra o Corona e a Fome, que desde abril de 2020, até os dias de hoje mantém a distribuição de alimentos agroecológicos para 7 territórios. Daremos continuidade no ano de 2022, estudando os formatos.
Nesta ação desde o início enfatizamos a necessidade de apoio e desenvolvimento de práticas que fortaleçam a geração de renda, através da agroecologia urbana, no caso plantando e processando os alimentos, através de cozinhas comunitárias. Nossa ideia é que se estimulem núcleos populares da Rede Ecológica, organizados ao redor de feirinhas agroecológicas, que tornem os alimentos agroecológicos algo viável.

Quanto à ênfase ambiental, a agroecologia é um novo paradigma, com uma outra lógica que não a do sistema capitalista.
Mas para além da agroecologia, temos trabalhado com o tema dos 3 Rs (reduzir o consumo de produtos que criem muito lixo, reaproveitar ao máximo, e reciclar, compostando principalmente). Neste sentido lutamos contra os plásticos, cuja presença foi quase eliminada nas entregas de frescos. Mas continua um desafio para os produtos secos, que não vêm a granel, e sim em sacos plásticos.
Temos uma campanha Xô Saco Plástico! Que conseguiu implantar em uma feira onde funciona um núcleo da Rede Ecológica – Campo Grande – a ausência de sacos plásticos, trabalhando-se produtores e consumidores para aceitar e se comprometer com esta medida. Desta mesma campanha Xô Saco Plástico fazem parte nosso circuito de retorno de vasilhames, escapando dos plásticos, em um processo de mudança de hábito.
Também o repasse de objetos de modo cuidadoso é assumido por uma comissão recente, a Repasse com o Coração, que atende aos territórios da campanha com itens que pessoas não querem mais.
Estas dimensões mostram o quanto fomos além das nossas compras, buscando inclusive participar na implementação de políticas públicas que contemplam a segurança alimentar. Participamos do Consea Rio ativamente há muitos anos.
Não é pouco.