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Relato do I Seminário de Agricultura Urbana (Parte I)

A parceria com a AS PTA, na realização do I Seminário Interno da Rede Ecológica de Agricultura Urbana, garantiu além da qualidade da mediação de Márcio Mendonça, a relatoria do seminário que divulgaremos em 2 etapas. Este é um relato que destaca os principais pontos. Na próxima Carta deverá ser finalizado.

Data: 17/06/2020

Presentes: Tínhamos um público de aproximadamente 100 pessoas através do canal do Youtube. Da organização do evento estavam Flávia Salazar, Beto Jansen, Luisa Mushu, junto com Mariana Portilho e Letícia Ribeiro da AS-PTA.

Pauta:
– Superação dos impactos da Pandemia através da AU
– Um Panorama da Agricultura Urbana no Rio de Janeiro (Rede CAU)
– A experiência da Fundação Angélica Goulart em Pedra de Guaratiba (FAG)
– A experiência do Centro de Integração da Misericórdia (CEM)

A abertura ficou a cargo de Miriam Langenbach (Rede Ecológica), a mediação ficou com Márcio Mendonça (AS-PTA), sendo os convidados Bernardete Montezano (RedeCAU), Paulo Monteiro (FAG) e Marcelo Silva (CEM).

A seguir deram depoimentos: Rafael Moura, pelo Centro de Atividades Comunitárias (CAC) de São João de Meriti, Débora Silva (pela ONG Sim Sou do Meio) e Silvano Leite da Silva, representando o Assentamento Oswaldo de Oliveira.

ABERTURA

Miriam Langenbach (Rede Ecológica) abordou a Rede, seus quase 20 anos, e a diversificação de ações desenvolvidas, especialmente nestes últimos 5 anos. Foi dado destaque ao processo de compras coletivas, a busca de um novo paradigma, e daí os princípios que norteiam este movimento: a autogestão na estrutura da organização, a fidelidade aos produtores, o apoio à reforma agrária, a preservação ambiental. Foi falado das ações em diferentes áreas: organização das compras coletivas, interação com os produtores, educação e comunicação, e movimentos sociais.

Destacou os 2 últimos anos, de um governos muito autoritário, e a busca de apoio ao MST, através da campanha de compra de um caminhão para o Coletivo Alaíde Reis, do Sul Fluminense, fazendo visitas sistemáticas ao Assentamento Terra Prometida, na Baixada Fluminense.

Na pandemia é importante destacar a manutenção das entregas de frescos e secos pelos núcleos da Rede Ecológica, o que foi muito significativo tanto para produtores quanto para os consumidores. Foi um momento de medo, discutiu-se as medidas de prevenção e higiene, havendo todos os cuidados necessários.

Uma segunda forma de apoiar nossos produtores foi a definição pela compra deles, destinando seus produtos para territórios com os quais tínhamos proximidade, estruturando a campanha O Campo de Favela de Mãos Dadas – contra o Corona e a Fome de acordo com os princípios da Rede Ecológica. Combinamos com nossos produtores preços mais baixos levando comida de verdade para 7 territórios necessitados. Ao mesmo tempo desde o início enxergávamos que a campanha teria que ir além das cestas, buscando implantar novos caminhos ligados à Agricultura Urbana, à Educação Alimentar e à possibilidade de acesso constante à comida de verdade. Havendo ainda a perspectiva de efetivação de Núcleos de Consumo Populares apoiados pela Rede Ecológica. Algo a ser construído a médio prazo.

Importante que paralelamente começamos a nos movimentar para o exterior e foi criada uma Associação de Amigos da Rede Ecológica na Suíça (http://bemvindo.ch/). Havendo também a campanha de arrecadação da AMAR na França e a campanha de arrecadação no Brasil também através do site da Rede Ecológica.

Miriam, então, apresentou brevemente os 7 territórios envolvidos na campanha:
– Na Zona Oeste estão envolvidas: a Fundação Angélica Goulart (ex-Fundação Xuxa Meneghel) que tem um trabalho consolidado em relação a crianças de Pedra de Guaratiba.
– Em Vargem Grande a Articulação do Plano Popular das Vargens que atende a famílias da região.
– Em Magalhães Bastos, através do Projeto Juca – Juntando Cacos com Arte e do Coletivo Rua Solidária por ele criado para a campanha específica do coronavírus.
– Na Zona Norte a instituição é o CEM que tem um trabalho de muitos anos de agricultura urbana na Serra da Misericórdia.
– Em Belford Roxo, é o SIM! EU SOU DO MEIO que atende à crianças e famílias da Rua do Meio.
– E, finalmente, no Norte Fluminense, em Macaé, o Assentamento do MST Osvaldo de Oliveira que a despeito de se considerado um modelo para o desenvolvimento sustentável está, atualmente, sob ameaça de despejo.

MEDIAÇÃO Márcio Mattos Mendonça (AS-PTA)

– Comenta que a Rede Ecológica há bastante tempo reúne consumidores que percebem a importância de alimentos saudáveis e querem ir além. Destaca as questões sociais, em que os consumidores têm um papel na busca de um mundo mais justo.
– Esclarece que o objetivo desse Seminário é a troca de experiências com pessoas que querem saber mais sobre Agricultura Urbana e se articulam como uma rede de consumidores críticos.
– Fala de sua história com a agricultura urbana e destaca o seu papel cultural. Lembra-se de como o conversar sobre uma bananeira, que alguém plantou, foi importante para estabelecer trocas e afetos. A Rede Ecológica coloca um viés político para esse tema. Reflete o lugar que queremos viver, que realidade queremos construir. Bom abrir o leque do que é uma Agricultura Urbana que extrapola a questão agrária, a questão técnica.

APRESENTAÇÕES

Bernadete Montezano (Rede CAU) inicia falando do sentimento de luto, pois vivemos um contexto muito difícil de 5 mil mortes em nosso município. Comenta que está em total isolamento por sua precária saúde, e por ser grupo de risco. Fala dos 10 anos de associada da Feira Agroecológica de Campo Grande e do núcleo Campo Grande da Rede Ecológica.

Fala como representante de AAFA (Associação Agricultores da Feira Agroecológica de Campo Grande), um território com história de agricultura que sempre é invisibilizado. Fala ainda pela Articulação de Agroecologia do Estado do Rio de Janeiro. A Rede Carioca de Agricultura Urbana nasceu junto a AS-PTA. Um momento muito importante foi a participação do I Encontro Nacional de Agricultura Urbana.

Fala a partir de sua vivência, e percebe o termo agricultura urbana como algo em disputa. É das experiências e dos fazeres que a RedeCAU se formou, o formato em rede nós faz ter essa propriedade da agricultura urbana.

Trajetória da agricultura urbana, tem várias outras experiências maravilhosas com as quais dialogam mas o foco será a RedeCAU. São muitas as dimensões no DNA da RedeCAU, uma diversidade de saberes e sabores, o afeto presente nas relações com as pessoas, mas o mais forte é a questão dos espaços serem espaços de organização. Grupos que perceberam que pela organização podemos dar um salto maior. Somos mais fortes em rede, em união. Não adianta fazer uma horta isolada se você não se integra com o seu território. É necessário para isso que nos conectemos, reconectemos e nos alinhemos com os grupos.

A cidade do Rio tem uma característica bem peculiar. A Serra da Misericórdia é muito urbana, assim como a Vanessa que tem uma horta bem no centro de Campo Grande, lugar bem urbanizado. Nossa agricultura urbana é agroecológica, esta é uma característica básica. Nossa caminhada começou como ação do movimento agroecológico, não tem uma visão comercial ou oportunista. Temos uma luta pelo acesso, pela autonomia, não queremos qualquer semente. Temos a percepção que esse alimento tem que chegar a todas as pessoas, tem que ser acessível. Tem o projeto Morar e Plantar, que converge com a luta pela moradia. É algo que está no nosso imaginário, mas lutamos para que tenhamos acesso a um lugar de plantio e um lugar de produção. No Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural, travamos uma luta com o Plano Diretor da Cidade, com a missão de dialogar com a equipe técnica que está fazendo essa revisão.

Temos forte o diálogo com outras redes. A agricultura urbana é feita por mulheres (coletivos de mulheres), movimento de Economia solidária (PACs), movimento de consumidores (Rede Ecológica)

Há a busca da preservação da biodiversidade, não queremos uma agricultura que envenena a água, uma semente não crioula, não biodinâmica, temos que levar em consideração que o ser humano existe enquanto natureza. Agricultores e Agricultoras são nossos anciãos e anciãs, que preservam saberes e os territórios.

Lutar para que o alimento fosse acessível a todos também fez parte, a luta pela Lei Orgânica de Segurança Alimentar, e conseguimos aprová-la, estabelecendo diálogo com o legislativo. Ajudamos a formar a Frente Parlamentar de Segurança Alimentar e Nutricional, e também de Agricultura Urbana. O mesmo em relação a uma Política Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica e a política de Agricultura Urbana Estadual. Dentro disto houve a luta pela alimentação escolar ser local, cumprindo a lei.

Quanto ao controle social fomos trilhando caminhos para sair da invisibilidade, ocupando espaços no CONSEA e CMDR, que já tinha sido extinto, mas seguimos forte faz alguns anos. Também estamos presentes junto à Comissão de Produção Orgânica (CPORG) do Ministério de Agricultura e Pecuária.

O Rio de Janeiro tem muitas unidades de conservação, e tem havido muita batalha pelo correto entendimento do que é um maciço.

Outro aspecto é que muitos agricultores urbanos estão nas feiras, na comercialização para sobreviver. Isto fortalece o entendimento de outros modos de fazer a economia e o próprio controle sobre as práticas: agregamos o Sistema Participativo de Garantia, o selo orgânico que dá autonomia e visibilidade para a produção. O Márcio Mendonça junto com a Cristina Ribeiro conseguiram viabilizar o quintal certificado, nos dando uma autoridade em relação ao que produzirmos. Pegando e pautando a importância de certificar quintais e feiras.

Nisto tem ajudado muito a Campanha Produtos da Gente, a Campanha Xô Saco Plástico.

Comida não é negócio, não podemos falar de alimentação sem a presença dos agricultores. É um território em construção. Na Aldeia Maracanã tivemos que tirar asfalto. São outras trajetórias, cada um com a sua, com pessoas de outros estados que fazem todos os dias a agricultura no Rio de Janeiro, é nossa recampenização, como disse Paulo Petersen. O território é o lugar onde se vive, é o lugar onde viveram nossos antepassados. É um lugar de luta.

MEDIAÇÃO Márcio Mattos Mendonça (AS-PTA)
– Agricultura não é só colocar semente na terra, pois um agricultor precisa da estrada, logística, o preço, detalhes da comercialização, a articulação. É pensar na organização da cidade, no abastecimento da cidade.
– O Circuito Carioca de Feiras Orgânicas é um circuito de 18 feiras orgânicas e aproximadamente 200 agricultores. Tem como conselho gestor a AS-PTA, Aula, Essência Vital, ABIO e mais alguém que ajuda a prefeitura a construir políticas públicas. Acabamos de tomar conhecimento que a prefeitura revogou o conselho gestor, o que significa que apenas a prefeitura diz o que pode acontecer. Estamos colocando on line um abaixo-assinado contra esta medida. É algo muito grave. (…)

Veja Parte II do relato do Seminário na próxima Carta Semanal.